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CORES
1.
Um carro…
Rodas preso nas linhas;
todas,
corpo
entre troncos
lambidos
a fogo.
Dentro, as margens do vento
na face
rosada
florida flora
rústica telha vermelha.
Pelo outro lado, sobem
gorjeios
líquidos
aos pés das cabras.
Não corras a voz
nos fios
telefónicos
ela soa melhor
nos fios
do chão.
2.
Onde estiveram, assim, tão cheios
de seiva teus seios simples,
duros.
(Suculência apertada na boca
da urze e da carqueja
até meus olhos?
Esse leite escorrido
pela ranhura das pedras, teu corpo
despido no murmúrio do sol?)
O verão na face e a luz
mais viva dos círios, sorvo-te
completa, a boca inteira
entrelinhas sinuosas…
Onde estiveram, assim, tão cheios
de seiva teus seios simples,
duros
sem meus lábios?
3.
Os calcanhares do tempo
ressoam na terra, homem,
em ecos
as vidraças que te ouvem!…
Entra
vivo
cor e som.
(Que calor
visionarias agora
na hora
das ancas dançando
na seda do lago onde dormes?)
Quantas sombras,
salpicos oceânicos,
no orgânico rosto metalizado…
(E tu,
através do cano,
namoras
a hora
que te leva ao chão?)
a sombra
a sombra do sono
e de novo dormes!…
4.
Quantas aves fazem ninho no teu corpo
quanta abundância de húmus
agarrado a tuas pernas
são tuas lágrimas quem rega?
É intenção do observador, nesta hora menos própria do dia
despir-se como todos os amantes [a esta hora menos própria do dia
gemem as flores o sol da tarde — sem refresco de frutos por perto onde
mergulhar a boca ressequida ou o corpo (como sofá de pele
que a luz vai comendo)].
É intenção do observador, nesta hora menos própria do dia
mergulhar como todas as crianças nos tanques que povoam a cidade
sem o constrangimento da nudez exposta ao transeunte dando cor
à reportagem de meteorologia: — até fez levantar o asfalto!…
É intenção do observador, nesta hora menos própria do dia
dormir a sesta — até deus o fez ao sétimo dia, porque não fazê-lo
o pobre poeta à sétima hora — após o sol lamber a terra?
Quando subires a serra,
verás o resto
e saberás quem dorme na tela
jorrando água pelos olhos.
5.
Desapareceu o arauto
essa figura de gente que nos batia à porta dos tímpanos
com as novas do dia, lá pela baixa,
e interpelava os manequins passeantes com os fatos último grito,
com sua voz rouca de bagaço.
Desapareceu o arauto
mas a desgraça, não. Tal como o ardina, também ela se veste
de maltrapilho. Farrapos com nome, sim. Farrapos são manequins
passeantes com seus fatos último grito,
(pensando que envergonham as montanhas frias
a noroeste dos sonhos
onde mais uma desgraçada teve um bastardo
do dono da fábrica.
— Já não se usa?!…)
Desapareceu o arauto
e a voz dos bastardos do mundo — fui com eles:
Subimos as penedias interiores onde o tempo parou.
É lá que vivem agora, luz e cor, abrigados por detrás de um cartaz
anunciando cerejas na face da estrada.
E o lugar vai-se enfeitando pelas suas mãos:
cortam-lhe os cabelos espinhosos enquanto as cabras pastoreiam.
Desapareceu o arauto
das ruas
frias
nuas
como a voz dos homens!
6.
Não
mudou
de nome
a lagoa ao fundo do corpo
nem
as mãos
que a mergulham
ganharam asas e novo voo
revivem
apenas
a estrada
com renovado sabor
a luz que outrora era e não via
7.
A minha mãe encontra-se no quadro
rentinho ao chão
pintada a flores de tons sagrados
murmura quando acorda
pelo estio
sedes à minha boca
como fugir deste chamamento
solteiro?
nos traços da lua vejo
pedaços dela
como é bela a minha mãe
viva no quadro
rentinho ao chão.
FERNANDES, Júlio A. B. – Maio 2009
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